sexta-feira, 12 de abril de 2024

A GRANDE COMISSÃO E A LIBERDADE DE EXPRESSÃO: Desvendando as Razões por Trás da Relutância de Muitos Líderes Evangélicos em Abordar o Tema


 

Israel Rodrigues e Natan Rodrigues

 

 A GRANDE COMISSÃO E A LIBERDADE DE EXPRESSÃO


1.            INTRODUÇÃO

Diante dos últimos acontecimentos de ordem mundial, em que de um lado figura uma autoridade da mais alta corte do Brasil, o Sr. Ministro Alexandre de Moraes (Ministro do STF e atual presidente do TSE), e de outro lado, o bilionário Elon Musk, proprietário do ex-Twitter, atual X.

No dia 6 de abril de 2024, o bilionário questionou o ministro sobre o porquê de ‘tanta censura no Brasil’. No dia seguinte, 7 de abril, um domingo, Musk fez novas postagens. Ele afirmou que Moraes ‘traiu descaradamente e repetidamente a constituição e o povo do Brasil’. Além disso, ele pediu que o ministro renunciasse ou sofresse impeachment, e alertou que irá divulgar todos os perfis que foram banidos sem o devido processo legal[1].

Em resposta, no dia 8 de abril, uma segunda-feira, o ministro Alexandre incluiu Musk no inquérito 4.874, que preside na suprema corte. Ficou assim definido:

Diante do exposto, DETERMINO:

1) A INCLUSÃO DE ELON MUSK, dono e CEO (Chief Executive Officer) da provedora de rede social “X” -anteriormente “Twitter”, em face do cargo ocupado, como investigado no INQ. 4874, pela, em tese, DOLOSA INSTRUMENTALIZAÇÃO CRIMINOSA da provedora de rede social “X” - anteriormente “Twitter”, em conexão com os fatos investigados nos INQ 4781, 4923, 4933 e PET 12100;

DETERMINO, ainda, que:

3) A provedora de rede social “X” SE ABSTENHA DE DESOBECER QUALQUER ORDEM JUDICIAL JÁ EMANADA, INCLUSIVE REALIZAR QUALQUER REATIVAÇÃO DE PERFIL CUJO BLOQUEIO FOI DETERMINADO POR ESSA

SUPREMA CORTE OU PELO TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL, sob pena de MULTA DIÁRIA DE R$ 100.000,00 (cem mil reais) POR PERFIL e responsabilidade por desobediência à ordem judicial dos responsáveis legais pela empresa no Brasil.

Mas qual é a relação que essa discussão entre duas pessoas influentes tem com o tema do artigo proposto? Diríamos aos caros leitores que tem tudo a ver. Os direitos discutidos aqui, em primeiro lugar, nascem de um estado organizado, com direitos fundamentais que emanam diretamente da lei suprema do país, a nossa Constituição da República de 1988. Em segundo lugar, os direitos fundamentais são frutos de lutas, acordos e convenções internacionais dos quais o Brasil é signatário. Por outro lado, todos esses direitos estão abrigados pela liberdade de expressão, estatuídos na Constituição de 1988.

Já em relação à Grande Comissão, é notoriamente conhecido que nos países onde não há liberdade de expressão, liberdade religiosa ou liberdade de culto, também não há pregação efetiva do evangelho. Quando ocorre, é de modo clandestino, sendo considerado um ato ilícito e criminoso, ocorrendo no submundo. A gênese dos direitos individuais está historicamente atrelada ao cristianismo.

A questão é: Por que muitos líderes evangélicos se silenciam diante de um tema tão relevante? Seria isso um pecado de omissão? Como ficam os direitos e deveres dos cidadãos cristãos que votam compulsoriamente? É obrigação apenas do ímpio lutar por direitos conquistados a duras penas? Qual é a realidade dos países em que não há liberdade de expressão?

Este artigo pretende, de modo sucinto, abordar essas questões, justamente por entender que o tema é de alta relevância. O crente não pode ficar omisso a essas questões que envolvem a liberdade de expressão, que também abrange a liberdade de crença, liberdade religiosa e a liberdade de culto.

2.    2PREVISÃO DA GRANDE COMISSÃO E A LIBERDADE DE EXPRESSÃO

2.1.  A Grande Comissão

A Grande Comissão é entendida como uma ordem dada por Jesus Cristo aos seus discípulos após a sua morte e ressurreição. A base que fundamenta esse chamado para a ação de anunciar as boas novas de salvação encontra-se nas seguintes referências: Mt 28:16-20; Mc 16:15-16; Lc 24:46-49; Jo 20:21; Atos 1:8. Essas referências bíblicas embasam a propagação da fé em todas as nações.

A igreja primitiva desenvolveu-se sob esse imperativo. No capítulo 13 de Atos dos Apóstolos, Barnabé e Saulo são enviados pela igreja de Antioquia. Posteriormente, o apóstolo realizou mais duas viagens missionárias, cumprindo assim a ordem dada por Jesus (At 15:40; 19). A esse respeito, a Declaração de Fé das Assembleias de Deus, (2017, p.79), preceitua:

O evangelho é proclamado a homens e mulheres, sem fazer distinção de raça, língua, cultura, ou classe social, pois “o campo é o mundo” (Mt 13.38). Jesus disse: “Portanto ide, fazei discípulos de todas as nações” (Mt 28.19-ARA), “e ser-me-eis testemunhas tanto em Jerusalém como em toda a Judeia e Samaria e até aos confins da terra” (At 1.8). Portanto, entendemos que é responsabilidade da Igreja a obra missionária.”

Fica claro, portanto, que a natureza do ‘Ide de Jesus’ não é política, ideológica ou filosófica. Ela é divina e relaciona-se com a salvação do homem caído, distanciado de Deus e que precisa nascer de novo (Jo 3;1-21). Assim, o evangelho não está restrito a um território, a uma nação, a um continente. A característica da Grande Comissão é a universalidade.

Apesar de não estar restrito a um território, como mencionado no parágrafo anterior, o mundo é dividido geograficamente em continentes e territórios que formam estados e nações independentes, com legislações específicas próprias. Ademais, cada nação possui suas características próprias, como línguas, culturas, ideologias, formas de governo, democracias e ditaduras etc.

É nessa atual conjuntura geopolítica que a igreja está inserida, com a missão de evangelizar e levar as boas novas de salvação. Sendo assim, é mais do que um dever, é uma obrigação de todo crente contribuir com governos que sejam justos, leais, honestos e com governantes que possuem uma cosmovisão judaico-cristã.

2.2.       A Liberdade de Expressão

A Liberdade de Expressão encontra amparo na Constituição de 1988, mais precisamente no artigo 5º, incisos IV e V, in verbis.

IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato; V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem.

A liberdade de expressão é um direito fundamental. Nas palavras de José Afonso da Silva (2000, p. 247), em sentido amplo, significa:

A liberdade de comunicação consiste num conjunto de direitos, formas, processos e veículos, que possibilitam a coordenação desembaraçada da criação, expressão e difusão do pensamento e da informação. É o que se extrai dos incisos IV, V, IX, XII, e XIV do art. 5o combinados com os arts. 220 a 224 da Constituição. Compreende ela as formas de criação, expressão e manifestação do pensamento e de informação, e a organização dos meios de comunicação, esta sujeita a regime jurídico especial.

Portanto, é um direito fundamental e uma garantia individual dada pela Constituição, juntamente com o direito à vida, a liberdade de ir e vir, o direito à intimidade, à igualdade, de propriedade etc. Esses são direitos que não podem ser alterados, nem mesmo ser alvo de emendas à Constituição, pois são considerados cláusulas pétreas nos termos do art. 60, §4º da CRFB/88. Por outro lado, a CRFB/88 prevê em seu artigo 5º, §§, o seguinte:

§ 2º Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.
§ 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais.

Nesse sentido, o Brasil é signatário da Declaração Universal dos Direitos Humanos das Nações Unidas, que foi influenciada pela Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789. O artigo 19 da DUDH preceitua o seguinte:

Todo ser humano tem direito à liberdade de opinião e expressão; esse direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e idéias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras.

A Constituição Federal, no caput do art. 220, §2º, é categórica:

A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição. § 2º É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística.

A Carta Magna proíbe toda e qualquer forma de censura. O que temos visto nos últimos três anos é a censura pura e descarada, combinada com prisões políticas, banimentos de perfis em plataformas digitais e inquéritos ilegais, que não respeitam o sistema acusatório e do juiz natural.

Os direitos e garantias individuais são tão importantes que não podem ser abolidos, pois são protegidos, como já falado anteriormente, pela cláusula pétrea. Mas, não somente por isso, o princípio jurídico do não retrocesso, ou a cláusula do não retrocesso, proíbe a supressão ou a redução de direitos e garantias individuais ou direitos sociais.

Mas, qual é a relação que tudo isso tem com a Grande Comissão? É o que veremos a seguir

3. 3RELAÇÃO ENTRE A GRANDE COMISSÃO E A LIBERDADE DE EXPRESSÃO: CONECTANDO OS PONTOS

Inicialmente, para desenvolver este ponto, é necessário ler as palavras do nosso mestre: “Portanto, ide, ensinai todas as nações, batizando-as em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo” (Mt 28.19); “E disse-lhe: Ide por todo o mundo, pregai o evangelho a toda criatura” (Mc 16.15). Os textos relacionados com o ‘Ide’, nos evangelhos e em Atos dos Apóstolos, mostram que a pregação do evangelho deve acontecer no mundo inteiro, do grego, kósmos, falando da totalidade do universo.

Seria muito contraditório se o nosso Salvador enviasse suas testemunhas para pregar e anunciar as boas novas no mundo todo, e ao mesmo tempo fechasse as portas de modo que o evangelho fosse impedido de ser anunciado. Se há alguém interessado em impedir que o evangelho seja anunciado, e almas não sejam salvas, esse alguém é Satanás (Ap 12.9). O que é necessário ser entendido por muitos cristãos é que o nosso adversário também usa pessoas, governos, ideologias, culturas, leis etc., para perseguir e impedir o avanço do evangelho.

Essa prática de Satanás não é nova. Ele sempre tentou impedir que os decretos e desígnios de Deus fossem realizados. Apenas para citar, temos a tentação de Eva e a queda de Adão (Gn 3. 1-24), a ordem do Faraó às parteiras para matar os meninos (Ex 1.15-17), e a matança de crianças por Herodes com a intenção de matar Jesus (Mt 3.13-18). Temos inúmeros exemplos no Antigo Testamento que mostram a perspicácia de Satanás usando pessoas para de algum modo impedir os propósitos de salvação do homem.

Mas, vejam o seguinte: aquilo que é mais importante da perspectiva bíblica para o homem, a saber, a salvação da alma, não é compulsório. O homem tem o livre arbítrio para escolher entre crer que Jesus é o Filho de Deus ou não. O que quero dizer é que, do mesmo modo, as pessoas são livres para escolher em que sociedade querem viver, seja uma sociedade livre ou não, seja em uma democracia ou em uma ditadura. Essa é uma decisão muito pessoal, porém, a palavra nos adverte: “Feliz a nação cujo Deus é o Senhor" (Sl 33.12).

Os versículos citados a respeito da Grande Comissão são os fundamentos do direito natural de ir e vir, do direito natural de poder falar e proclamar o evangelho ao mundo inteiro. É importante dizer que, das religiões conhecidas, talvez a única que permite uma investigação profunda da fé é o cristianismo. Isso é liberdade; o cristianismo não priva ninguém de questionar a fé, pelo contrário, a Palavra estimula o crente a ter uma fé racional.

Se chegamos até aqui, neste estado de liberdade de um Estado Democrático de Direito, foi pelas conquistas do cristianismo. A educação, as universidades, direitos humanos, direito à vida, movimentos sociais, igualdade, diversidade religiosa etc. Quando Jesus diz: “Ide por todo o mundo”, Ele estava justamente profetizando todos esses avanços por meio da pregação do evangelho.

Diante do exposto, fica claro que a Grande Comissão guarda relação intrínseca com a liberdade de expressão, pois a liberdade de expressão é uma conquista do cristianismo. Ideologias contrárias à cultura judaico-cristã são antagônicas à liberdade de expressão e à liberdade de opinião.

Portanto, não é preciso muito esforço para saber que só é possível cumprir o ‘Ide’ de forma plena, com liberdade, onde há liberdade de expressão. Nos países autoritários e ditatoriais, não existe liberdade para pregar o evangelho, nem liberdade de culto e religiosa. A prática da fé cristã em países autoritários acontece de modo clandestino e materiais educativos são contrabandeados.

A Grande Comissão, a ordem dada por Cristo a seus discípulos após a sua morte e ressurreição, aconteceu no primeiro século da nossa era, registrada nos Evangelhos e em Atos dos Apóstolos. Por outro lado, a liberdade de expressão remonta à primeira geração de direitos humanos, relacionada à Revolução Francesa e à independência dos Estados Unidos, com ênfase na liberdade.

O Brasil vive um momento histórico em que a liberdade de expressão, uma conquista do cristianismo, vem sendo relativizada. O Brasil, um país conservador formado em sua maioria por católicos e protestantes, não pode ficar omisso às conquistas que têm sua gênese na Bíblia Sagrada.

Nos próximos tópicos, abordaremos os impactos do cerceamento da liberdade de expressão na propagação do evangelho, sobretudo, em países onde não há essa liberdade.

4. 4OS IMPACTOS DO CERCEAMENTO DA LIBERDADE DE EXPRESSÃO NA PROPAGAÇÃO DO EVANGELHO: PAÍSES EM QUE NÃO HÁ LIBERDADE DE EXPRESSÃO

Dúvidas inexistem quanto aos impactos negativos consequentes à ruína da liberdade de expressão. Um rápido olhar pelo Globo terrestre nos permitirá ver claramente a dura opressão que os cristãos e não cristãos enfrentam nos países em que a liberdade de expressão se encontra restrita à propaganda oficial do Regime.

Inicialmente cita-se o caso dos países da Janela 10/40, região do Planeta que abriga quase 4 bilhões de pessoas, das quais, aproximadamente 1,8 bilhões nunca ouviram falar sobre Jesus e o Evangelho; essa extensa área está situada entre 10 e 40 graus ao norte da linha do equador.

Essa região caracteriza-se pelas precárias condições de vida, pobreza crônica e dificultoso acesso aos recursos cristãos. Uma outra característica marcante é a presença de ditaduras e governos autoritários. Apenas para citar alguns, temos a China, Irã, Iraque, Arábia Saudita e Índia.

Conforme dados do Portal SEMIPA – Semeadores Missionários com Paixão pelas Almas e a Organização Missionária Portas Abertas, dos 50 países com perseguição ao cristianismo, classificada como extrema ou severa, 37 se encontram na referida região. Encabeçam a lista da terrível perseguição aos cristãos: Somália, Líbia, Eritreia, Iêmen, Nigéria, Paquistão, Sudão, Irã, Afeganistão, Índia, Síria e Arábia Saudita, todos da região em apreço[2].

Apesar de tudo, o pior país do mundo para evangelização, não se encontra na Janela 10/40, mas sim na Ásia: trata-se da Coréia do Norte, a conhecida Ditadura Comunista. Conforme o Portas Abertas:

Ser descoberto como cristão na Coreia do Norte é efetivamente uma sentença de morte. Ou os cristãos são enviados para campos de trabalho forçado como prisioneiros políticos, onde eles enfrentam uma vida de trabalho duro a que poucos sobrevivem, ou são mortos no local[3]

Imaginar esse dantesco quadro como ideal ao crescimento da Igreja ou ainda como inevitável pela simples proximidade do Apocalipse, chega a ser uma desonra ao amor cristão que deve reinar entre os crentes. Historicamente, a realidade chocante desse país tem encontrado amparo de nações como Rússia e China. Inacreditavelmente cristãos de esquerda, apaixonados pelo marxismo e comunismo, raramente se posicionam contra isto, mas fazem vista grossa a esse maçante teatro de horrores.

Talvez se possa objetar que essa apatia se explique pela enorme distância que essa nação possui em relação ao Brasil. Mas o fato é que a ditadura corrente na Ilha de Cuba, em nosso próprio continente, tampouco desperta uma ojeriza e repúdio em muitos cristãos.

Conforme o Portas Abertas, em 2024, Cuba é o vigésimo segundo país no mundo em perseguição severa ao cristianismo. A Colômbia, em nossa América Latina, ocupa a posição de número 34, e Nicarágua, fica mais a frente com a posição número 30 e o México, na América Central, ocupa o 37º lugar no ranking[4].

O simples traçado exposto é suficiente para demonstrar que a Igreja, por meio de seus líderes, membros e congregados, não pode isentar-se de sua missão, tanto evangelística quanto institucional, de posicionar-se contra os desmandos de qualquer sistema político autoritário e ditatorial, que agrida os direitos humanos, mormente a liberdade de expressão.

É bem verdade, que muito se fala contra o Nazismo e o Fascismo, (que são igualmente reprováveis), contudo, há muito que estes Estados totalitários desapareceram de sobre a terra, restando somente alguns grupos extremistas que defendem essas aberrações.

Não obstante, as ditaduras comunistas infestam o planeta, e tem encontrado vias fartas para os seus desenvolvimentos. Curiosamente muitos crentes defendem e justificam abertamente esses regimes de exceção como reações necessárias ao imperialismo capitalista que, diga-se de passagem, em verdade, financia as pautas esquerdistas em todo o mundo. Mais tragicômico do que isso, é só o fato de que esses cristãos se posicionam, na prática, a favor dos regimes totalitários e contra os seus irmãos que sofrem as perseguições. Depois, com muita piedade, eles enchem os templos para clamarem a Deus que conceda liberdade para que o Evangelho seja pregado nesses países.

Passa-se agora à análise das prováveis razões que estão por trás da relutância de muitos líderes em enfrentar essa temática, em especial, no Brasil.

5.  5RAZÕES POLÍTICAS, TEOLÓGICAS E SOCIAIS POR TRÁS DA RELUTÂNCIA DE LÍDERES EM ENFRENTAR O TEMA.

Em tempos de crescente autoritarismo político em terras brasilis, cuja marca principal é a censura e a perseguição a adversários políticos e grupos conservadores, muitos cristãos e líderes eclesiásticos, encontraram um doce subterfúgio para se eximirem de seus deveres sociais: as ocupações com Ide de Jesus e o cuidado com a Igreja de Deus.

No geral, estes estão apoiados em alguns argumentos interessantes. Se lhes dizemos que devem se posicionar perante a maldade e a ditadura que ameaçam o Brasil, eles respondem que esse não é o seu chamado, mas sim pregar o Evangelho; se lhes é dito que devem ensinar aos congregados acerca das heresias, bem como contra os arroubos autoritários que minam na nação brasileira, eles respondem que o mundo vai de mal a pior e que isso já estava escrito e ainda que o seu dever é pregar a palavra.  Se lhes objetamos que a censura e a ditadura são gravames aos próprios crentes, eles nos dizem: nada e nem ninguém pode impedir a propagação do Evangelho. E é desse modo que essas verdades eternas são utilizadas para esconder uma dolosa omissão que beira a covardia pura e simples.

Que verdades possam ser ditas para encobrir propósitos ruins, é coisa que ninguém desconhece, o que realmente chama a atenção é o fútil temor existente por trás desse comportamento conivente com o erro. Sob o pretexto de se achegarem mais perto do céu, pela concentração excessiva nas mensagens bíblicas e na comunhão com os santos, esses temerosos cristãos, mostram uma omissão indigna de qualquer paraíso celestial.

Mas não parece ser somente o temor, o fundamento real dessa aversão a um posicionamento corajoso e firme, infelizmente, alguns crentes, nas suas entranhas, apoiam a opressão e a crescente ditadura no País. Estão aliançados de corpo e alma com os carrascos da nação e se utilizam da verdade bíblica para suavizarem em seus corações o peso de conviverem com uma dura culpa.

Não poucos cristãos brasileiros são comunistas e esquerdistas declarados ou enrustidos. Incapazes, seja por ignorância ou voluntariedade, de perceberem e abandonarem os dogmas comunistas, se agarram a eles com a força de um fanático torcedor. Com efeito, não são poucos os que acreditam em uma fusão harmônica entre o cristianismo e o comunismo, vendo em muitas passagens bíblicas um Cristo comunista e revolucionário.

A predominância do marxismo na cultura brasileira em geral, e em especial nas universidades e principais canais de televisão, naturalmente promoveu uma espécie de repúdio e aversão a qualquer pensamento conservador. Este é visto como contrarrevolucionário e retrógrado, típico de pessoas intolerantes e sem amor no coração.

Assim, muitos líderes, por temor de atrair a si uma forte antipatia social, e mesmo uma perseguição, trilham o caminho do politicamente correto, evitando quaisquer termos e expressões que possam ofender as suscetibilidades alheias. Não percebem que, com este modo de agir, confirmam que já estão sob a censura, e o que é pior, a fortalecem pela sua submissão.

Alguns alegam ainda que devem viver pacificamente e de forma ordeira entre seus irmãos, promovendo a paz, a tolerância e uma vida tranquila e sossegada. De fato, este é o mandamento apostólico, contudo, ele não pode servir de pretexto a omissões quanto a um dever que também está fundado na Bíblia e na Grande Comissão. Aliás, aqueles que piamente desejam viver o Evangelho, padecerão perseguições.

Não parece que os mais caros valores da civilização, como a liberdade, igualdade, tolerância etc., tenham surgido de omissões semelhantes a estas. Vejamos:

a)    No Antigo Testamento uma das facetas do ministério profético era a denúncia dos pecados da nação israelita, bem como dos outros povos;

b)    O ministério de Jesus Cristo, consistiu, em certo sentido, no desvelamento da verdade, pela qual os homens são libertos. Ora o que é revelar a verdade, senão escancarar as mentiras e as ilusões?

c)    Os Apóstolos ao pregarem o Evangelho, anunciavam a necessidade do arrependimento, pelo abandono das práticas pecaminosas, e a conversão à Cristo. Eles não se acovardaram diante de Reis, Governadores e autoridades, antes não cessaram de pregar a verdade. Imagine uma multidão ouvir da boca dos Apóstolos: “Mas vós negastes o Santo e o Justo, e pedistes que se vos desse um homicida, e matastes o Príncipe da vida, ao qual Deus ressuscitou dos mortos, do que nós somos testemunhas”[5];

d)    No decorrer dos séculos essa Igreja foi, em extremo, perseguida, mas nunca deixou de se posicionar com clareza e prontidão diante dos desmandos, perseguições, ditaduras e injustiças que sofreu. Que diremos de um Agostinho ou de um Tertuliano?

e)    E quanto aos Reformadores? Decerto não ficaram aquém de seus deveres. A começar pelo próprio Lutero que corajosamente denunciou as injustiças da Igreja Católica no tocante a venda de Indulgências e outras benesses. João Calvino, Philipp Melanchthon, Ulrico, Thomas Müntzer, e tantos outros demonstraram cabalmente que a Igreja desempenha um papel crucial na sociedade pela pregação do Evangelho, o qual envolve a denúncia dos pecados cometidos pelas pessoas de qualquer estamento ou classe, inclusive a denúncia das injustiças cometidas pelos governantes;

O Cristão precisa com firmeza e honestidade intelectual dar nomes às coisas. O que está ocorrendo hoje no Brasil, em termos de censura e perseguição a adversários políticos, padres e pastores? É óbvio que a resposta é um regime de exceção, onde, claramente, as liberdades e garantias individuais são violadas e desrespeitadas, inclusive e principalmente, pelos tribunais.

Pregar o Evangelho, portanto, envolve revelar os pecados que corroem a sociedade, chamar os pecadores ao arrependimento, levando-os a converterem-se a Cristo. Mesmo porque, ninguém terá do que se arrepender se os seus pecados não lhe forem expostos. Claro que isto deve ser feito com amor e mansidão, mas deve ser feito.

Por fim, grande parte do teor da autêntica pregação evangelística, já está amordaçado: uma boa parte dos pregadores somente prega prosperidade e bençãos; outra parte, mensagens que agradam o ego dos ouvintes; outros, mensagens de autoajuda e coaching; há aqueles que não pregam nada, e nos cultos só se ouvem e veem barulhos e movimentos sem nenhum fundamento bíblico; líderes que estão preocupados em não perder fiéis, praticamente minaram a exposição da palavra e transformaram as suas igrejas em boates e casas de shows. Nesse cenário, não admira que apenas uns poucos tenham tomado coragem de se posicionarem com firmeza e ousadia perante os censores e carrascos do Brasil.

6.    CONCLUSÃO

A interconexão entre a Grande Comissão e a liberdade de expressão se revela como uma trama intrincada de direitos fundamentais e missão espiritual. O chamado de Jesus para espalhar o evangelho pelo mundo inteiro constitui uma ordem divina, e, uma afirmação da liberdade intrínseca ao cristianismo.

Assim como a mensagem de salvação é universal, a liberdade de expressão é um direito inalienável, estabelecido tanto na Constituição humana quanto na vontade divina. A história mostra que onde a liberdade é restringida, a pregação do evangelho é sufocada, restringindo o direito do homem de escolher a sua fé.

Portanto, a proteção da liberdade de expressão não é apenas uma questão legal, mas também uma questão de ordem espiritual, fundamental para a disseminação do evangelho e para a preservação da autonomia do indivíduo na busca pela verdade espiritual.

A omissão de muitos líderes evangélicos em enfrentar a temática, adotando um posicionamento claro e firme, denuncia por um lado, a odiosa mistura do sagrado com o profano, passando pela simples conivência com o erro, e por outro, um zelo biblicamente equivocado com a Igreja e a Evangelização.

Em suma, o crescimento e a proteção da Igreja, não deve se firmar apenas em um cuidado que se fecha entre as quatro paredes de uma interpretação reducionista do texto sagrado, mas sim em uma visão bíblica de que a pregação do Evangelho contempla a realidade total da sociedade, e inclui no seu bojo todos os seus membros, inclusive os políticos, e os que ocupam os tribunais: estes, assim como os demais, devem ouvir a mensagem do Evangelho que chama ao arrependimento.

 

BIBLIOGRAFIA

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial [da] União, Brasília, 5 out. 1988. Disponível: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm>.

CGADB, Declaração de Fé das Assembleias de Deus. CPAD: E-book, 2017.

DUDH. Declaração Universal dos Direitos Humanos, (Paris, 1948), http://www.un.org/en/universal-declaration-human-rights/

SILVA, José Afonso. Aplicabilidade da norma constitucional. 4ª.ed. São Paulo: Malheiros, 2000.

SAGRADA, Bíblia. Antigo e Novo Testamentos. Traduzida em português por João Ferreira de Almeida, ed. rev. e atualizada no Brasil, 2ª ed., São Paulo, Sociedade Bíblica do Brasil, 1993, entre outras versões.

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