Por Natan Costa Rodrigues
O propósito desta breve reflexão é a discussão em torno do corpo humano na era dita pós-moderna. O fato, que salta aos olhos, é que esse corpo está constantemente à mostra e se mostra cada vez mais. Esse movimento é ostensivo e constante. Não importa para onde se lançam os olhos, quase sempre algum corpo estará à mostra, realçando, por meio das vestes, as suas formas naturais. Eis o fato. Agora passemos a meditar no significado disto, isto é, no significado do corpo dentro desse contexto presente na atual sociedade.
I - Breve panorama evolutivo
A primeira coisa que
prontamente observamos, é uma mudança na forma como o corpo é exposto. Nas
sociedades primitivas e tribais, dadas as circunstâncias, ele não era tão
coberto. Obviamente, esse quadro sofreu variações conforme o exigisse a
geografia, o clima envolvido, e determinados fatores socioculturais emergentes.
Após esse período inicial, desenvolveram-se algumas tradições e instituições
humanas que influenciaram as vestes das sociedades mais civilizadas: as roupas
passaram a cobrir quase todo o corpo, e indicavam, em algumas situações, certa dignidade
especial conferida a quem as utilizasse: honrarias, cargos, riquezas, etc. Lado outro, certas vestes serviam de estigma
da pobreza, classe social e indignidade. Esse padrão perpassou por toda a
história e chega até os dias atuais.
No que tange ao corpo em si, em
algumas culturas, era tido como algo impuro e imundo. Daí, talvez, a
necessidade de o cobrir. De fato, a vestimenta traz em si o senso de uma certa vergonha
com relação aquilo que se pretende esconder. Nas sociedades mais civilizadas,
essa vergonha é fugidia, pois as vestes não possuem somente a intenção de
esconder alguma coisa do corpo, como também a intenção de o redimir e
dignificar em alguma medida.
De todo modo, aí se
estabelece uma funcionalidade para as vestes e adereços, isto é, que com o
surgimento da hierarquia social, e das diferentes funções, elas foram se
alterando conforme cada funcionalidade, ganhando, desse modo, um significado
distinto da mera ocultação do corpo.
À luz do exposto, é certo
fixar que a tendência, ao menos até o século XIX, foi de cobrir e vestir os
corpos. Gradualmente, no entanto, ao longo dos últimos dois séculos, eles foram
gradativamente descobertos, como em um processo inverso ao que houve no
princípio.
II - O corpo humano e o Cristianismo
Ora, o desnudamento do corpo,
envolve, por certo, a noção contrária à de o cobrir: se ele é coberto devido a
um peculiar senso de vergonha, então o seu descobrimento, remete a perda dessa
vergonha. Mas se se perde a vergonha, então com ela se vai a antiga concepção
de vestimenta que a acompanhava. As roupas ganharam outra funcionalidade: não
mais exprimem a dignidade do corpo, mas, ostentam as suas propriedades e formas
naturais.
O ser humano atual tomou
consciência das propriedades e formas da sua carne. Na cultura pós-moderna, o
corpo já não é visto como algo impuro, já não é uma prisão da alma e do
espírito; ele é tomado como constituinte da própria personalidade, como algo
integrante da própria pessoa. O movimento atual se dá ao avesso daquilo que, em
algumas culturas, se tornou preponderante, isto é, que a superação do corpo, mais
precisamente da carne, se coloca como condição para a santificação, ou consiste
no próprio processo da santificação.
Não é menos verdade,
entretanto, que a atual valorização do corpo físico guarda raízes na própria
civilização cristã, onde ele foi resgatado de sua condição impura que gozava no
gnosticismo e em alguns departamentos da filosofia grega. O cristianismo
apresentou um homem tricotômico, formado de corpo, alma e espírito e, cuja
realização plena, envolve a harmonização e a santificação dessas três partes.
O movimento atual, por outro
lado, é muito distinto dessa visão cristã; pode-se mesmo dizer que é o seu
contrário. Na atual percepção do corpo, ele deve ser exposto, deve se mostrar e
aparecer. Tal exibição não provoca dor e nem vergonha. No cristianismo
tradicional, o corpo é encoberto por conta da existência de uma plêiade de
valores, dentre eles sobressai a castidade, o pudor e o fato do homem ter sido
feito à imagem e semelhança de Deus. Há no cristianismo ortodoxo, uma espécie
de sacralidade do corpo, pelo qual ele deve ser guardado e respeitado, e esse
senso de santidade do corpo está ausente na pós-modernidade. Nesta, a santidade
foi substituída por um senso de propriedade sobre o próprio corpo, em que ele
se torna uma ferramenta para se alcançar os interesses exigidos pela sociedade.
III - Corpo humano e Pós-modernidade
O ser humano pós-moderno é
movido pelo corpo e pela exposição corporal. Ele não é moldado por valores
atemporais ou eternos, mas há nele uma certa axiologia corporal, no sentido de
que o seu próprio corpo se transmudou na face visível pela qual ele mostra os
seus valores. Dito de outro modo, os seus valores mais excelentes se mostram
por meio da mostração do seu corpo.
Se uma pessoa qualquer exibe
as suas formas, está mostrando, com isto, os valores que lhe são superiores: o
empoderamento, o senso de fortaleza, a beleza, etc. Eis o curioso fenômeno: ou
os valores que outrora eram considerados superiores já não existem, ou a nossa
sociedade considera como superiores, outros valores e ela os exibe, não por
meio do intelecto, mas por meio da exibição do corpo. Desse modo, as pessoas se
sentem mais inteligentes, bonitas, e importantes, portanto, virtuosas, quanto
mais exibem os seus corpos, quanto mais mostram os seus dotes corporais.
De fato, atualmente o corpo,
em muitas situações, define os outros aspectos do indivíduo: ele parece englobar
a substância da moralidade e a própria imagem que o indivíduo tem de si. O
indivíduo compensa os seus haveres perfeitamente no seu próprio corpo. Na
prática, o ser humano, está resolvendo os seus dilemas, os seus conflitos
existenciais, por meio da exposição corporal. Atualmente, ele soluciona as suas
crises interiores e espirituais, por meio de uma afirmação do próprio corpo.
Com efeito, problemas que
antigamente exigiam um subjugar ascético do corpo e laboriosos estudos de
natureza moral e intelectual, são atualmente resolvidos por meio da afirmação
do corpo, da ostentação de suas partes e da sua sensualidade. O ser humano está
vivendo em um tempo em que a dimensão corporal é crescentemente valorizada, ao
tempo que ofusca partes mais nobres, como o coração. Não é exagero dizer que
estamos vivenciando uma animalização do ser humano. Nesse processo ele perde
substância ontológica, espiritual e intelectual.
Mas, o mais grave em tudo
isto, é que esse comportamento sensual e exibicionista do corpo, não
seja defendido pelas classes iletradas e pobres da população, mas ao contrário,
seja abertamente defendido e incentivado pelas elites, ditas intelectuais, por
professores e por militantes.
São pessoas formadoras de
opinião que estão defendendo a sensualização precoce; são cientistas sociais e especialistas
que defendem a nudez explícita e a pornografia como ferramentas de crescimento
pessoal; que defendem o sexo livre e a depravação do ser humano como estratégias
de libertação. A sensualização do corpo encontra em nossos dias uma defesa
teórica, uma defesa pretensamente científica, para se mostrar, para se fazer
presente na sociedade e para ser imposta por meios supostamente legítimos.
IV - Conclusão
É óbvio que estamos vivendo
um quadro grave. E este não aparece emergindo das periferias da sociedade, em
locais separados e marginalizados, mas surge no centro das instituições da vida
social, como algo essencial para a construção de um novo mundo, e uma nova
sociedade. Já não se trata mais de algo que é promovido para corromper as
pessoas, mas de algo cujo objetivo é o crescimento das pessoas. A sensualidade
do corpo, o seu desnudamento, agora são consideradas ferramentas de
desenvolvimento pessoal e de ascensão social.
Eis o cruel diagnóstico. A
cura para a doença, continua sendo a sabedoria de Deus revelada na pregação do
Evangelho, o qual não é uma teoria, mas o poder de Deus para a salvação do
homem caído. Com efeito, onde abundou o pecado, superabundou a Graça divina. É
necessário, portanto, pregar a verdade; salvar pela Graça e educar pela Palavra.
Somente a sabedoria divina em Cristo pode tomar forma no mundo, mudando a
cultura hedonista que grassa na sociedade atual.
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